sábado, 8 de agosto de 2009

Carlos Nejar

Deus não é a palavra Deus

e andorinha,

a palavra andorinha.


Há um poço

que não entra

na palavra poço.


O amor, na palavra amor.


E Deus é tudo isso.

(O Chapéu das Estações, Carlos Nejar)

 

Escreverei aurora nos navios,

nos bosques, nas manhãs dentro do vento,

Escreverei aurora no horizonte,

nas tardes, nos silêncios, nas areias.


Escreverei aurora sobre os mapas,

nos cisnes, nos pássaros, nos rios.

Escreverei aurora sobre os homens,

aurora nas mulheres, nos meninos,

aurora sobre os olhos, sobre os braços.

Aurora está contigo.


Escreverei aurora com o nome de minha mãe

ou uma árvore na infância.

Escreverei aurora no murmúrio das águas,

das palavras.


Escreverei aurora de mansinho

como se diz: amada.

Escreverei aurora.

(Livro de Silbion)

 

 

Um comentário:

Vida Mística disse...

http://carlosnejar.sites.uol.com.br/Antologia.htm

Os meus sentidos

Carlos Nejar




Um dia vi Deus numa palavra
e luminosa despontava, argila.
E Deus vagueava tudo, aquietava
as numinosas letras, quase em fila.

E depois se banhava nesta ilha
de bosques e bilênios. Clareava
as formigas noctâmbulas da fala.
E nele os meus sentidos se nutriam.

Os meus sentidos eram coelhos ébrios
na verdura de Deus entretecidos.
A palavra empurrava o que era cego,

a palavra luzia nos sentidos.
E Deus nas vistas do menino, roda
e roda nos olhos da palavra.